Carlos Zíngaro encontra-se com Jorge Lima Barreto no JA2007
Três (ou quatro) questões ao mais internacional dos músicos experimentais portugueses, Carlos Zíngaro: músico violinista, improvisador, compositor de músicas de cena, professor. Mantém uma postura ímpar no contexto das músicas de arte e tocou, ao longo de três décadas e meio de carreira artística, com alguns dos mais importantes nomes da música experimental. Apontamos apenas dois dos inúmeros exemplos possíveis: o trombonista George Lewis que abriu ontem da melhor maneira o Jazz em Agosto 2007 ( com o pianista Muhal Richard Abrams e o saxofonista Roscoe Mitchell), ou a contrabaixista Joëlle Léandre que tocará em Lisboa no próximo fim-de-semana, Sexta 10 no Quartet Noir ( + Urs Leimgruber, Marilyn Crispell, Fritz Hauser), e em solo absoluto, Sábado 11.
As ideias que fixamos surgiram numa troca de emails, a propósito do encontro de Carlos Zingaro com Jorge Lima Barreto, amanhã Domingo 4, no Jazz em Agosto 2007.
1. Quando, e em que circunstâncias, tocou com Lima Barreto?
Presumindo que se refere a tocar em duo devo referir que, as únicas vezes em que tal aconteceu foi justamente na gravação do disco KITS em 1992 e, posteriormente, numa brevíssima apresentação do mesmo no Porto...
Houve vários encontros musicais entre mim e JLBarreto ao longo de mais de 30 anos mas sempre com outros intervenientes – os Telectu (com Rui Reininho e depois com Vitor Rua), os Anar Band, etc..
Este concerto no Jazz em Agosto será portanto a primeira (verdadeira) apresentação pública deste duo, e exclusivamente na sua vertente acústica, visto que no disco JLB utiliza sintetizadores e samplers para além do piano.
2. Para o concerto do próximo Domigo, na Gulbenkian, fizeram algum trabalho preparatório, ou será um encontro / confronto de dois músicos que falam a mesma linguagem e que esperam entender-se em improviso total? Quais as suas expectativas?
Não houve – como na realidade nunca tal existiu – qualquer tipo de trabalho preparatório, determinação de convenções, estruturação de parâmetros ou conversa informal sobre o que poderá acontecer neste concerto, para além da sua eventual duração de 50’ máximo...
Será pois um encontro, revisitado 15 anos depois, aonde tudo está em aberto, pelo menos no que me diz directamente respeito.
É esta a atitude que frequentemente assumo em novos (re)encontros.
O risco do inesperado quando se juntam personalidades musicais que não têm uma prática comum e/ou regular.
É o (estimulante) risco de um jogo em que tudo se pode perder ou ganhar em breves segundos de cumplicidade e entendimento ou, pelo contrário, no conflito de egos ou no autismo declarado...
Na gravação de um disco, como na composição, haverá sempre a oportunidade da edição posterior, da selecção, do apagamento, da correcção – coisa inexistente e impossível no contexto de concerto público.
Expectativas tenho-as sempre, apesar das décadas que levo destas práticas – uma das muitas razões que me fazem continuar a acreditar na espontaneidade musical = a adrenalina do inesperado, do momento de construção irrepetível, único!
O contexto é fantástico – pelo espaço e pelo evento.
Acrescentarei ainda que é a primeira vez que sou, enquanto membro de um duo iniciativa de outrém, convidado a integrar a programação do Jazz em Agosto. Toquei neste evento uma primeira vez, no seu início, enquanto convidado do grupo programado – o Trio SHIS (José Peixoto, Paulo Curado e José Martins) e uma segunda vez, extra programa – como tal alheio à programação determinada em cartaz – com Daunik Lazro e Raymond Boni.
Durante o brevíssimo período em que José Sasportes foi director do ACARTE e em que o habitual programador do Jazz em Agosto foi afastado, aceitei – como outros – o convite daquele director para Carta Branca na programação dos (então) três dias do Jazz em Agosto – coisa que fiz, conscientemente o melhor que sabia e podia dados os exíguos meios ao dispôr. Não me auto-programei nessa Carta Branca, mas fui inevitavelmente massacrado pelos “patrões do jazz” nacional!
Uma polémica velha de mais de trinta anos que me cansa e repugna. Que me entristece!
Isto para terminar dizendo que, tendo sido na prática o primeiro a ter projectos próprios na área da improvisação neste país (desde 1967), tendo depois continuado, durante trinta e cinco anos, uma carreira internacional independente e isenta de qualquer apoio Lusitano, continuo a nada dever às instituições públicas ou privadas deste país para a continuação do que me propus, da actividade a que me determinei...
3. O que o tem mantido ocupado? Muitas saídas para concertos em agenda? Compor para suporte a outras artes, Teatro ou a Dança?
As músicas de cena têm-se revelado particularmente escassas nestes últimos anos. Se houve uma recuperação desta actividade internacionalmente – com consecutivas residências e criações em França com o coreógrafo Francis Plisson – em Portugal, para além das esporádicas colaborações com os bailarinos/coreógrafos Ludger Lamers, Yola Pinto e Ana Santos e encomendas de Vasco Welencamp, o trabalho para teatro despareceu quase na íntegra e colaboração regular com outras artes performativas revela-se inconsistente e, como tal, inconsequente.
Motivos vários poderão sempre ser determinantes – cargos directivos essencialmente políticos que inevitavelmente oneram os verdadeiramente independentes, uma (hiper) apregoada crise económica, a sobrevalorização dos INS e OUTS da nossa (?) sociedade (?!) artística (???), as vantagens tecnológicas que permitem a qualquer encenador/coreógrafo (auto)determinar-se em director musical/compositor, fazendo colagens de recolhas discográficas a gosto pessoal, impune perante a passividade autoral aqui vigente...
Felizmente que, passados todos estes anos, continuo com uma actividade essencialmente (por necessidade e evidência) voltada para o exterior.
Depois de uma derradeira investida na constituição de um colectivo de músicos próximos esteticamente (a Granular em 2003) se ter inevitavelmente revelado uma brilhante utopia, pela incapacidade quase orgânica de artistas serem capazes de unir esforços por causas comuns, irei continuar a canseira de correr para aeroportos e combóios e hotéis... até parar!
As ideias que fixamos surgiram numa troca de emails, a propósito do encontro de Carlos Zingaro com Jorge Lima Barreto, amanhã Domingo 4, no Jazz em Agosto 2007.
1. Quando, e em que circunstâncias, tocou com Lima Barreto?
Presumindo que se refere a tocar em duo devo referir que, as únicas vezes em que tal aconteceu foi justamente na gravação do disco KITS em 1992 e, posteriormente, numa brevíssima apresentação do mesmo no Porto...
Houve vários encontros musicais entre mim e JLBarreto ao longo de mais de 30 anos mas sempre com outros intervenientes – os Telectu (com Rui Reininho e depois com Vitor Rua), os Anar Band, etc..
Este concerto no Jazz em Agosto será portanto a primeira (verdadeira) apresentação pública deste duo, e exclusivamente na sua vertente acústica, visto que no disco JLB utiliza sintetizadores e samplers para além do piano.
2. Para o concerto do próximo Domigo, na Gulbenkian, fizeram algum trabalho preparatório, ou será um encontro / confronto de dois músicos que falam a mesma linguagem e que esperam entender-se em improviso total? Quais as suas expectativas?
Não houve – como na realidade nunca tal existiu – qualquer tipo de trabalho preparatório, determinação de convenções, estruturação de parâmetros ou conversa informal sobre o que poderá acontecer neste concerto, para além da sua eventual duração de 50’ máximo...
Será pois um encontro, revisitado 15 anos depois, aonde tudo está em aberto, pelo menos no que me diz directamente respeito.
É esta a atitude que frequentemente assumo em novos (re)encontros.
O risco do inesperado quando se juntam personalidades musicais que não têm uma prática comum e/ou regular.
É o (estimulante) risco de um jogo em que tudo se pode perder ou ganhar em breves segundos de cumplicidade e entendimento ou, pelo contrário, no conflito de egos ou no autismo declarado...
Na gravação de um disco, como na composição, haverá sempre a oportunidade da edição posterior, da selecção, do apagamento, da correcção – coisa inexistente e impossível no contexto de concerto público.
Expectativas tenho-as sempre, apesar das décadas que levo destas práticas – uma das muitas razões que me fazem continuar a acreditar na espontaneidade musical = a adrenalina do inesperado, do momento de construção irrepetível, único!
O contexto é fantástico – pelo espaço e pelo evento.
Acrescentarei ainda que é a primeira vez que sou, enquanto membro de um duo iniciativa de outrém, convidado a integrar a programação do Jazz em Agosto. Toquei neste evento uma primeira vez, no seu início, enquanto convidado do grupo programado – o Trio SHIS (José Peixoto, Paulo Curado e José Martins) e uma segunda vez, extra programa – como tal alheio à programação determinada em cartaz – com Daunik Lazro e Raymond Boni.
Durante o brevíssimo período em que José Sasportes foi director do ACARTE e em que o habitual programador do Jazz em Agosto foi afastado, aceitei – como outros – o convite daquele director para Carta Branca na programação dos (então) três dias do Jazz em Agosto – coisa que fiz, conscientemente o melhor que sabia e podia dados os exíguos meios ao dispôr. Não me auto-programei nessa Carta Branca, mas fui inevitavelmente massacrado pelos “patrões do jazz” nacional!
Uma polémica velha de mais de trinta anos que me cansa e repugna. Que me entristece!
Isto para terminar dizendo que, tendo sido na prática o primeiro a ter projectos próprios na área da improvisação neste país (desde 1967), tendo depois continuado, durante trinta e cinco anos, uma carreira internacional independente e isenta de qualquer apoio Lusitano, continuo a nada dever às instituições públicas ou privadas deste país para a continuação do que me propus, da actividade a que me determinei...
3. O que o tem mantido ocupado? Muitas saídas para concertos em agenda? Compor para suporte a outras artes, Teatro ou a Dança?
As músicas de cena têm-se revelado particularmente escassas nestes últimos anos. Se houve uma recuperação desta actividade internacionalmente – com consecutivas residências e criações em França com o coreógrafo Francis Plisson – em Portugal, para além das esporádicas colaborações com os bailarinos/coreógrafos Ludger Lamers, Yola Pinto e Ana Santos e encomendas de Vasco Welencamp, o trabalho para teatro despareceu quase na íntegra e colaboração regular com outras artes performativas revela-se inconsistente e, como tal, inconsequente.
Motivos vários poderão sempre ser determinantes – cargos directivos essencialmente políticos que inevitavelmente oneram os verdadeiramente independentes, uma (hiper) apregoada crise económica, a sobrevalorização dos INS e OUTS da nossa (?) sociedade (?!) artística (???), as vantagens tecnológicas que permitem a qualquer encenador/coreógrafo (auto)determinar-se em director musical/compositor, fazendo colagens de recolhas discográficas a gosto pessoal, impune perante a passividade autoral aqui vigente...
Felizmente que, passados todos estes anos, continuo com uma actividade essencialmente (por necessidade e evidência) voltada para o exterior.
Depois de uma derradeira investida na constituição de um colectivo de músicos próximos esteticamente (a Granular em 2003) se ter inevitavelmente revelado uma brilhante utopia, pela incapacidade quase orgânica de artistas serem capazes de unir esforços por causas comuns, irei continuar a canseira de correr para aeroportos e combóios e hotéis... até parar!
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